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Dossiê do Vereador

Cecílio Santos (PT)

Por Guilherme Nakamura

4 min leitura

Nossa série sobre a Câmara de Campinas na atual legislatura continua analisando os vereadores do PT. Passamos hoje a um vereador com perfil distinto da Paola Miguel: o senhor Cecílio Santos. Cecílio tem 52 anos e é natural de Caldeirão Grande (Bahia), mas mora em Campinas há mais de 33 anos. Eleito com 2592 votos, Cecílio representa comunidades eclesiais de base e a pastoral operária, representando assim alas do PT ligadas a movimentos da Igreja Católica no Brasil e do sindicalismo. No nível local, Cecílio faz trabalhos focados na região do Campo Grande, onde também tem residência. Além das várias indicações para zeladoria pública para esse distrito, o vereador destaca sua participação na implantação do Instituto Federal de São Paulo em Campo Grande.

Tal como sua colega Paola, Cecílio também escreveu vários projetos de lei (PLs), mas de perfil diverso. Apenas um projeto pode ser enquadrado no bloco das preocupações woke sobre raça, o PLO 140/21. Contudo, tal projeto diz respeito à obrigatoriedade do campo raça/cor em formulários do sistema de saúde, sendo relativamente inofensivo. Várias de suas propostas dizem respeito à assistência social e medidas de auxilio municipal para pessoas em extrema pobreza (PLO 75/21, PLO 125/21, PLO 62/22, PLO 103/22, PLO 243/22). Três PLs dizem respeito à saúde ou a pessoas com deficiência física (PLC 72/21, PLO 65/21, PLC 88/22), quatro a algumas mudanças nos serviços públicos da cidade (PLC 39/21, PLC 82/21, PLC 4/22, PLO 242/22) e quatro sobre a infraestrutura urbana (PLC 30/21, PLC 15/23, PLC 74/23, PLO 149/23). Como projetos avulsos, ele também discorre sobre a obrigatoriedade do uso de energia fotovoltaica em prédios públicos (PLC 68/21) e de uma padronização da organização dos times de futebol da região (PLC 96/21).

Embora a teologia defendida por Cecílio não seja clara em suas entrevistas, é fato que a aproximação histórica das comunidades eclesiais de base e o petismo se deu através de intelectuais católicos defensores da Teologia da Libertação. Um preceito autoproclamado dessa escola teológica é o princípio de que a Igreja deveria se dedicar politicamente ao auxílio dos “pobres e oprimidos”. A identificação de tal grupo e o conjunto de ações feitos em seu favor se baseariam em uma leitura marxista da história e das Escrituras. A grande difusão dessa teologia na América Latina pode ser explicada em parte por causa da pobreza na região, e em parte por causa dos atritos entre lideranças católicas e ditaduras militares.

Não nos compete aqui entrar em minúcias teológicas contra ou a favor deste movimento; podemos, no entanto, afirmar que ele não foi efetivo na retenção de pessoas pobres na Igreja Católica. É fato inconteste que as igrejas evangélicas cresceram no Brasil, e que esse crescimento se concentra nas camadas C até E da população. A leitura marxista tradicional que atribuía ao trabalhador o papel de revolucionário se provou falsa – em parte, o wokismo tenta encontrar novos revolucionários contra o capitalismo. Outra falha dos teólogos da libertação foi abraçar a reforma agrária como grande pauta social. Ela pode dialogar com discursos acadêmicos a respeito das injustiças da concentração de terras brasileiras, mas ela também tem pouco apelo aos pobres da zona urbana (que são a maioria). Também não contribui que o movimento social de esquerda pela reforma agrária seja o MST, movimento que não tem nem mesmo elementos simbólicos em comum com o catolicismo.

É difícil prever qual será o futuro da associação entre comunidades eclesiais católicas e petismo nos próximos anos. Uma coisa é ter o apoio de um segmento intelectual da Igreja quando 90% dos brasileiros se diziam católicos, e a repulsa à ditadura militar fazia uma parte considerável deles serem simpáticos a ideias marxistas. Outra coisa é ter o apoio desse segmento quando o país tem entre 30% e 40% de evangélicos, e mesmo os católicos não veem sua fé representada por esses intelectuais.

Esse tipo de tensão se vê no mandato de Cecílio. Seu único PL aprovado que não diga respeito à atribuição de nomes a locais públicos é o lançamento da Campanha da Fraternidade em Campinas (PLO 207/21). Tal campanha é uma ação social da Igreja idealizada pelo Cardeal Eugênio de Araújo Sales, notório crítico da Teologia da Libertação. De fato, é preciso má-vontade para atribuir a Cecílio alguma orientação marxista, woke, ou outros atributos associados à esquerda mais ativa na Internet. É mais honesto dizer que Cecílio compra a narrativa oficial do seu partido, sem contudo ter o discurso e ações alinhadas com as tendências do partido de se radicalizar. Será que ainda há espaço na esquerda para pessoas como ele, ou será que elas serão absorvidas por outras correntes políticas?

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